02:57 - 22 de dezembro de 2024.

Aos 80 anos, Vassouras perde a professora Maria Lu...

Aos 80 anos, Vassouras perde a professora Maria Lucia Mexias

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• Membro da ALV, carreira vitoriosa na Educação, intelectual foi militante de causas sociais

Vassouras perdeu esta semana uma de suas referências na Educação. Morreu na terça-feira, dia 13, no Hospital Universitário, a professora Maria Lucia Mexias Simon, aos 80 anos. Maria Lucia não resistiu às complicações após ter sofrido um infarto no sábado, dia 9. Ela foi sepultada no Cemitério Municipal na manhã da quarta-feira, 14. Ao longo de uma vida dedicada à Educação, construiu uma sólida carreira acadêmica. Militante envolvida com as causas sociais, defensora de uma educação pública e de qualidade, foi professora da rede pública estadual e uma das responsáveis por trazer o Sepe (Sindicato Estadual dos Profissionais de Ensino) para Vassouras. Em 1992 foi candidata a vice-prefeita pelo Partido dos Trabalhadores.
Filha de Carlos Eugênio Mexias, um dos políticos mais populares da Vassouras do século XX, e de Maria Helena Reis, Maria Lucia nasceu no Rio de Janeiro em 1940. Chegou aos seis anos à cidade onde marcaria época. Como uma típica menina de classe média do seu tempo, fez o Curso Fundamental no Colégio de Vassouras, de dona Maria Araújo. Tornou-se professora com as irmãs do Colégio Regina Coeli. Aos 20 anos, iniciou sua carreira como professora da rede pública estadual. Em 1964 começou a trabalhar na Escola Técnica do Comércio de Vassouras, o curso de Contabilidade do Colégio de Vassouras. Entre 1968 e 1976 foi professora no Colégio dos Santos Anjos. Antes, em 1971, assumiu sua segunda matrícula no antigo Estado do Rio de Janeiro.
A vida acadêmica de Maria Lucia Mexias começou em Valença, onde graduou-se em Letras em 1973 na Fundação Educacional Rosemar Pimentel. Como professora, fez carreira na então Universidade Severino Sombra, onde ingressou em 1976. Nunca parou de estudar. Em 1989 concluiu o Mestrado em Linguística pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Na mesma UFRJ tornou-se doutora em Linguística em 1994. Concluiu o Pós-Doutorado em Filologia Românica pela Universidade de São Paulo (USP). Ocupava a cadeira 17 da Academia de Letras de Vassouras, que tinha como patrono Ozório Duque Estrada.
Como professora, foi uma defensora da educação pública de qualidade e de melhores condições de trabalho para os profissionais de Educação. No final dos anos 1980, foi uma das responsáveis pela chegada do Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação (Sepe) ao município. Sempre preocupada com as questões sociais, filiou-se ao PT nesta mesma época. Em 1992 integrou a chapa majoritária do partido em sua primeira disputa eleitoral em Vassouras. Foi candidata a vice-prefeita em uma chapa totalmente feminina, encabeçada pela médica Thais Maria Niemeyer da Rocha Monsores. Em uma campanha inesquecível para a militância de esquerda do município, a dupla conseguiu 12 % dos votos. Terminaram na terceira posição, atrás do prefeito eleito Renato Ibrahim (PDT), chegando a superar, em algumas seções, o ex-prefeito Narciso da Silva Dias (PMDB), segundo colocado.

Nos últimos anos, aposentada, Maria Lucia Mexias, viúva do artista plástico alemão Emilio Simon, era atenta às redes sociais. A partir de seu perfil no Facebook comentava os acontecimentos e sofria com o recrudescimento da pobreza no país. Crítica do governo do presidente Jair Bolsonaro, ela registrou ter recebido a segunda dose da vacina contra o coronavírus na semana passada. Ela sempre externava a dor de ter tido o neto, Augusto, morador de Miguel Pereira, assassinado, em uma situação nunca esclarecida, pela Polícia Militar. Augusto era filho de Maria Laura Mexias, também professora, já falecida.
Em tempos de pandemia e isolamento social, a morte de Maria Lucia foi marcada por homenagens virtuais. O diretório municipal do Partido dos Trabalhadores postou uma nota de pesar. “Em 1992, na primeira eleição municipal que disputou, o Partido dos Trabalhadores apresentou ao eleitorado vassourense uma chapa majoritária inteiramente formada por mulheres. Lá atrás, já sabíamos da importância das mulheres como protagonistas das mudanças que o povo brasileiro necessitava. Uma dessas companheiras, a professora Maria Lucia Mexias, candidata a vice-prefeita em 92, nos deixou na manhã de hoje, aos 80 anos. Infartou no sábado, chegou a ser internada no Hospital Universitário de Vassouras, mas não resistiu. Fica o legado de sua luta. Grande estudiosa da Língua Portuguesa, Maria Lúcia Mexias foi uma das responsáveis pela chegada do Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação (Sepe) a Vassouras. Fez parte da sua direção e sua voz nunca se calou, foi sempre atuante na defesa de uma educação pública e de qualidade. Sofreu com o assassinato de um neto e denunciou, com coragem, a violência policial que atingiu em cheio a sua família. O Partido dos Trabalhadores de Vassouras lamenta, profundamente, a morte da companheira Maria Lúcia, que seguirá sempre conosco na luta por um país mais justo e democrático!”, diz a nota do partido.
Colega de Maria Lucia na então USS, o professor Simão Pedro dos Santos, da Universidade Federal do Vale do São Francisco, fez uma das mais belas homenagens à professora:
“Combati o bom combate, terminei a corrida, guardei a fé. (Apóstolo Paulo, em 2.ª Carta a Timóteo, 4:7) 1999. Agosto. 14h. Vim me apresentar a então Universidade Severino Sombra, por indicação de um meu professor do curso de Letras da Universidade do Estado do Rio de Janeiro-Uerj. Num dos pavilhões da USS, (uso a antiga sigla, para nos situar no tempo), se encontrava uma senhora de gestos contidos, voz baixa e branda, olhos atentos, ar tranquilo e de simpatia discreta. Muito discreta. Recebeu-me com profissionalismo extremado, observou documentos, atentou para o currículo, que ainda não era o Lattes, e antes, muito antes de qualquer contratação, mas por ter observado detalhes do currículo, indagou se eu poderia participar de evento no curso de Letras a ocorrer dali a algum tempo. Aceitei o desafio. Na semana seguinte, (soube depois, bem depois), lutou para justificar a necessidade de minha contratação. Sustentou ser necessário ao curso mais um docente. De suas argumentações, veio a convicção da assinatura do documento. Eternamente grato! Hoje, porém, você resolveu nos deixar. Concluiu, talvez, que virar pássaro fosse melhor do que ficar por aqui em batalha inglória contra as injustiças às quais você sempre combateu. De repente, não foi mais possível suportar fariseus e ‘homens de bem’. A dor da perda é incalculável, mas a certeza da libertação, por vezes, nos conforta. Livre, você agora pode voar, pois o mundo velho é cruel e muito injusto, quase sempre. E não foram poucas as injustiças por que você passou. Forte como baraúna, enfrentou-as, todas, sem receio, empertigada. Sem medo. Agora, tudo passou. Descanse. Você ficou muito feliz com nossa volta a Vassouras. Queria muito vê-la, mas o momento em que vivemos não me permitiu. Guardarei a lembrança, a memória, a saudade. Siga em paz, pois aqui você “combateu o bom combate”, viveu a fé e a esperança em dias melhores. E houve um tempo de dias melhores, pelos quais você muito lutou. Você ainda viveu os dias em que ‘a esperança venceu o medo’. Siga, Maria Lúcia. Siga. Ficaremos por aqui, até quando nos for possível, em esperança, (ainda), sem medo e ávidos por justiça, a justiça por cujos caminhos você trilhou. Tenho certeza de que neste momento, numa dimensão que não sei calcular, ‘brilha uma estrela’. Vá em paz, Maria Lúcia Mexias. Por enquanto, quero só um pouquinho de silêncio.”

Comentários

3 respostas

  1. Parabéns a Tribuna por ter reservado esse merecido espaço a Maria Lucia Méxias!… Sim, deixará saudades, minha ex professora e amiga. E repito o que disse o professor no final do texto ” por enquanto, quero só um pouquinho de silêncio”

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