00:01 - 27 de julho de 2024.

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Na véspera do aniversário da Abolição, Paty se mobiliza e barra ideia de dar nome de pastor à Praça Manoel Congo

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• Vereador recua e retira projeto que mudava nome de praça no Centro de Paty do Alferes

Uma mobilização popular às vésperas dos 133 anos da Abolição da Escravatura barrou a tramitação de um projeto de lei que previa a retirada do nome do líder negro Manoel Congo de uma praça no Centro de Paty do Alferes. Autor da proposta de dar à praça o nome do pastor João Auto da Silva, o vereador Dudu Mariotti (PP) resolveu retirar o projeto na sessão da quarta-feira, 12. Antes de Dudu, todos os vereadores que se pronunciaram na sessão, que contou com um bom público e grande audiência no perfil do Facebook da Câmara, se manifestaram contrários à mudança. “Estou muito chateado, mas vou retirar o projeto para que o nome do pastor não saia derrotado”.
Africano, Manoel Congo foi sequestrado no seu continente e chegou a Paty escravizado. Em 1838 foi um dos líderes da maior rebelião de escravos nas lavouras de café do Rio de Janeiro no século XIX, ao lado de Marianna Crioula, como eram chamadas as negras nascidas já em território brasileiro, e de outros companheiros. A ideia era fundar um quilombo onde viveriam livres da chibata e do arbítrio da escravidão. A fuga em uma região tão importante – o então município de Vassouras era o maior produtor de café do mundo e o Império se sustentava na exportação do grão – mobilizou a Guarda Nacional e até uma tropa, chefiada por Luiz Alves de Lima e Silva, veio à região debelar a revolta, que se iniciou após a morte de mais um escravizado a partir dos maus tratos de um feitor que trabalhava para um fazendeiro importante na região. Um soldado morreu nos combates e, levado à julgamento, Manoel Congo foi condenado à forca. A sentença foi executada na manhã de 6 de setembro de 1839, no Largo da Forca, região hoje conhecida como Pedreira, no Centro de Vassouras.
Nas últimas décadas a luta de Manoel Congo e Marianna Crioula foi revisitada por uma nova historiografia, interessada não só no passado da classe senhorial e seus barões do café, mas na resistência dos negros escravizados. Em 1996, Vassouras inaugurou o Memorial Manoel Congo, no local de seu enforcamento. Paty do Alferes batizou a Praça, localizada no Centro, em 1999. Em 2010, a então deputada estadual Inês Pandeló (PT) aprovou a criação do Livro de Heróis do Estado do Rio de Janeiro. Por indicação dela, Manoel Congo e Marianna Crioula foram oficializados como heróis fluminenses. A homenagem inspirou o cineasta Ricardo Andrade Vassíllievitch, que lançou ano passado o documentário Marianna Crioula, um grito de resistência
O projeto de Dudu Mariotti gerou repercussão em Paty do Alferes, em toda a região e até mesmo em outras cidades do Rio de Janeiro. A ideia de Dudu era retirar Manoel Congo e batizar a Praça com o nome do pastor João Auto da Silva, líder da Assembleia de Deus, morto em janeiro pela Covid-19. “Ninguém nunca chamou a praça de Manoel Congo. Sempre foi a praça do jardim. Nada mais justo que ela ganhar o nome do pastor João, que fez história como pastor da Assembleia de Deus do Jardim, que fica em frente à praça”.
Movimentos que trabalham pela questão cultural e pelo turismo rural em Paty do Alferes se mobilizaram contra o projeto. Sempre destacando a importância do pastor, mas lembrando que ele poderá ser homenageado sem que seja retirada a homenagem ao líder negro. Na véspera da sessão, um seminário virtual organizado pela OAB RJ chamado para discutir reparação da escravidão, se transformou em uma tribuna em defesa da memória de Manoel Congo. “Abdias do Nascimento se aqui estivesse diria que isso tem nome. E o nome disso é racismo”, afirmou o presidente da Comissão Especial da Verdade da Escravidão Negra no Rio de Janeiro, Humberto Adami. Diversas seccionais da OAB enviaram à Câmara de Paty moções de repúdio à mudança, entre elas Vassouras, Barra Mansa, Mendes e Casemiro de Abreu.
Dez dos onze vereadores subiram à tribuna durante a sessão de quarta-feira para discordar do projeto de Dudu Mariotti. Sempre na linha de respeitar a memória de João Auto da Silva, mas lembrando que uma homenagem ao pastor não poderia coincidir com o veto ao nome de Manoel Congo. Falaram ainda Lucas Faillace Monte Mór, em nome do grupo de Turismo Rural, contrário à mudança e o historiador Sebastião Deister, um dos maiores conhecedores da história regional, que também pediu a reprovação do projeto. Após a sessão, populares presentes comemoraram a manutenção do nome do líder negro.

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